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Primavera: ressurreição da Vida    

 

“Lázaro, Ramos...e na Páscoa estamos”.

Este ditado popular significa a transitoriedade e rapidez do tempo que passa, sem que nos apercebamos disso.

Ainda há dias, festejávamos o Carnaval com os folguedos próprios da quadra e, passadas poucas semanas de vivência mais ou menos abstinente, eis-nos chegados às celebrações Pascais que tanto marcam a vida social e religiosa das nossas populações.

As gerações que nos precederam foram catequisadas numa dura prática da penitência que incidia sobre o consumo de bens essenciais, como forma de “castigar” as “tentações pecaminosas da carne”, como era uso dizer-se. A mentalidade monástica que orientou a educação religiosa dos povos destas ilhas, chegou até meados do século passado, através das populares “missões” que os franciscanos pregavam em muitas localidades. Muitos templos ainda conservam cruzes em madeira, assinalando a passagem de pregadores que permanecem na memória dos mais idosos.

As transformações sociais e religiosas, ocorridas a partir dos anos 60 do passado século, embora tenham mudado muitas formas de religiosidade, não conseguiram alterar a centenária tradição dos Romeiros, que também se está a recuperar noutras ilhas.

É de relevar as romarias de mulheres. Ancestrais preconceitos sexuais e sociais a que a Igreja Católica continua a resistir, ditaram-lhes um estatuto de menoridade e desigualdade face aos homens. Oxalá estas manifestações públicas de fé, constituam um processo de afirmação e reconhecimento dos seus direitos e qualidades, como mães e educadoras da fé.

E não fora esses cânticos e orações penitenciais que ecoam pelos caminhos e povoados destas ilhas, o consumismo teria inundado a nossa vida, com os seus atraentes mas supérfluos produtos.

Os ovos de páscoa são, nesta quadra os sabores de hoje.

Quem ainda se lembra dos folares, cozidos nos fornos de lenha pelas nossas mães e avós?

A lida começava com a recolha da melhor lenha seca, transportada das terras altas e ladeiras, em carros de bois e da apanha de ramos verdes para varrer as brasas do forno. Na véspera, as mulheres sovavam a massa de ovos em alguidares de barro. Antes de a cobrirem com mantas de retalho ou de lã, confecionadas em noites de inverno, desenhavam uma cruz “em nome do Pai do Filho e do Espírito Santo”. E deixavam a massa de folar levedar, até que o calor do forno, acendido ainda noite escura, estivesse adequado à cozedura. De manhã, tendia-se os folares com ovos, cobertos com tiras em forma de cruz. Quando a fornada estava completa, fechava-se a porta do forno e a padeira fazia, de novo o sinal da cruz, simbolo da crença no bom sucesso de tantas canseiras.

É verdade que o tempo pascal está intimamente ligado à primavera, tempo do ressurgimento da natureza, da vida nova, que também era uma época festiva entre os povos pagãos.

Os ovos dos folares continuam a simbolizar o germen de que resulta uma nova vida que transforma a natureza e alimenta a humanidade. No cristianismo, essa vida nova é Jesus, Cristo Ressuscitado, fonte e alimento da humanidade.

Será que os ovos de páscoa feitos de chocolate, conseguem transmitir a mensagem cristã que a secularização e o consumismo, propositadamente, ignoram para beneficiarem do valor acrescentado desses produtos adocicados mas frívolos?

Neste tempo de Quaresma, em que há um forte apelo à conversão de atitudes e mentalidades, em conformidade com os valores humanos e cristãos, importa não embarcarmos no consumismo que só promove desigualdades e desumaniza a sociedade.

Que a Primavera da vida que todos saudamos nos homens e na natureza nos ensine a ressuscitar o melhor de nós, e a reabilitar o mundo em que vivemos.

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